24/06/11

O presidente da Junta e o Munícipe

Valentim Silva, homem dos seus cinquentas, vigoroso e bonacheirão, trabalhador do campo desde que aprendeu a andar. Sempre de roupa de trabalho, mangas de camisa arregaçadas, a ver-se uma interior branca e suada e uns pêlos mais atrevidos a sair por fora, quiçá os que lhe faltam em cima…
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Entra na sala da Junta de boina na mão, a rodar, inquieto.
- B’tarde, Eudócio. Como vais? A família? O teu paizinho?
- Boa tarde, Silva. Tudo a correr bem. O paizinho lá se vai aguentando. A idade não perdoa, sabes? E que fazes por aqui homem? - responde o presidente da Junta.
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Amigos desde os tempos da escola, o tempo voltou atrás naquele segundo. Miúdos traquinas outra vez, de calções e camisola rota, a rodar o pião no adro da igreja, aos ninhos, em cima das árvores à chinchada, mais tarde juntos nos bailes atrás das raparigas.
Os olhos a brilhar com as recordações de infância.
Eudócio deixou-se ficar no negócio do pai, a serralharia, e acabou presidente da Junta, tal como o pai fora, no seu tempo. Valentim ficou no campo, como o pai. Vidas repetidas, enfim. Contrariamente à maioria dos rapazes que seguiram p'ra França e voltam nas férias, todos os anos, estes dois deixaram-se ficar na terra, seguindo o caminho dos pais, contempladores da paisagem e da vida.
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- Preciso de fazer o cartão do cidadão, é que tenho que renovar a carta…É que fui ao Sabugal, já duas vezes e nada feito! – explica Valentim.
- Então?
- Pois que não conhecem a minha morada e dizem que não tenho código postal! Já perguntei ao Luís que me disse que usasse um qualquer aqui da vila que tanto lhe fazia.
Luís é o carteiro da vila, o único nos últimos 20 anos, desde que o Sr. Alcides se reformou.
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- Pois claro! – afirma Eudócio.
- Nã senhor, voltei lá com um código que o Luís me disse e disseram-me que não servia. Que até existia o código, mas que a minha morada não existia. Disseram-me para ligar para a câmara ou para a Junta.
- Não tem lá a Cova dos Alqueides?! - à memória vem-lhe uma certa conversa com uma senhora de Lisboa...
- Mas se há mais de 100 anos que a minha família mora na Cova dos Alqueides! Eudócio, tens de lhes ligar a dizer que conheces a minha morada. - pedem os olhos de Valentim constrangido com esta dificuldade que lhe atrapalha o sossego da vida.

19/06/11

Toponímia - a origem

Definindo-se etimologicamente como o estudo histórico ou linguístico da origem dos nomes próprios dos lugares, a Toponímia, para além do seu significado e importância como elemento de identificação, orientação, comunicação e localização dos imóveis urbanos e rústicos, é também, enquanto área de intervenção tradicional do Poder Local, reveladora da forma como os Municípios encaram o património cultural.

Os nomes das freguesias, localidades, lugares de morada e outros, reflectem-se, e deverão continuar a reflectir, os sentimentos e as personalidades das pessoas e memoriam valores, factos, figuras de relevo, épocas, usos e costumes, pelo que, traduzindo a memória das populações, deverão a escolha, atribuição e alteração dos topónimos rodear-se de particular cuidado e pautar-se por critérios de rigor, coerência e isenção.

A Toponímia, como ciência auxiliar da História, foi criada por dois eruditos franceses, d’Arbois de Jubainville e Longnon, que se dedica ao estudo da origem e etimologia dos nomes dos locais. É um dos ramos principais da onomástica, ciência que também abrange a antroponímia, ou estudo dos nomes das pessoas.

As origens dos Topónimos são variados, e levam à divisão convencional da Toponímia em sub-grupos, sendo os mais importantes e conhecidos os seguintes:

•       Antrotoponímia, que trata dos topónimos derivados de nomes de pessoas;
•       Arqueotoponímia, que trata dos topónimos derivados de nomes de sentido arqueológico;
•       Fitotoponímia, que trata dos topónimos derivados de nomes de plantas;
•       Geotoponímia, que trata dos topónimos derivados da orografia e da geologia;
•       Hagiotoponímia, que trata dos topónimos derivados do culto da Virgem e dos Santos;
•       Hidrotoponímia, que trata dos topónimos derivados de nomes de rios, lagos e fontes;
•       Zootoponímia, que trata dos topónimos de nomes de animais;

As designações toponímicas devem ser estáveis e pouco sensíveis às simples modificações de conjuntura, não devendo ser influenciada por critérios subjectivos ou factores de circunstância, embora possam
reflectir alterações sociais importantes.

Nos tempos modernos que, basta pensar nos custos (em tempo e dinheiro) que advém da, aparentemente, simples actualização da morada de cada munícipe, para perceber como toda a problemática da toponímia deve ser encarada com grandes preocupações pelos responsáveis autárquicos.

enviado por Manuel Cabaço Lopes, colaborador Tótó honorário

16/06/11

A Porcalhota

Cada topónimo tem a sua origem.

Por volta de 1385, um fidalgo de nome Vasco Porcalho era senhor das terras onde hoje se localiza a Amadora. O fidalgo tinha uma filha a quem o povo pôs a alcunha de Porcalhota. Depois da sua morte, as terras ficaram para a sua filha e a sua alcunha ficou como nome da terra.

Em tempos, a filha de Cardoso Lopes adoece com tosse convulsa e vai recuperar na Quinta de Santo António da Amadora na Porcalhota. O pai acaba por adquirir uns lotes de terreno e instala-se definitivamente com a família.

O nome de Porcalhota arreliava os habitantes do local.

É Cardoso Lopes quem consegue rebatizar a Porcalhota. Em 1907, através de portaria do rei D. Carlos, passa a chamar-se Amadora.

adaptado da obra: "Levem-me nesse sonho...acordado!" de José Ruy

15/06/11

Os nossos homens chegam ao Brasil

Hoje é uma data histórica, 15 de Junho de 1922, os aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral chegam ao Rio de Janeiro, naquela que é a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, a bordo do hidroavião Lusitânia.

Por acaso estou triste com a Google, então não é que hoje tem a cara normal! Que bem ficaria uma imagem destes aventureiros, pioneiros da aviação!

A seguir está o link para o discurso que o Presidente da República fez na homenagem ao Almirante Gago Coutinho, na sociedade de geografia de Lisboa a 17 de Fevereiro de 2009


O discurso é um bocado longo, mas o essencial é o enaltecer de um homem que é o pai da Engenharia Geográfica em Portugal.
Gago Coutinho, em 1920, apresentou aos sócios da Sociedade de Geografia de Lisboa a proposta da criação em portugal de um curso de engenharia geográfica, ciente que estava da importância da tarefa de "saber onde estamos e para onde vamos".

Gago Coutinho (dir.) e Sacadura Cabral (esq.) a bordo do "Lusitânia", 1922.


Rota da primeira travessia aérea do Atlântico Sul.

imagens retiradas da wikipedia

14/06/11

Viva o GPS!

- Olá senhor contente.
- Olá senhor feliz.
- Diga a gente como vai a toponímia neste país?
- Diga à gente, diga à gente.
A caminho do sul, alegres e despreocupados. Fomos lá o ano passado!
Mas eis que surge um desvio.

Por definição um desvio é um caminho alternativo que vai de uma origem a um destino.

Pressupõe-se que o destino seja o mesmo.
Mas nem sempre é assim!
Não em Portugal.

Chega uma altura que as placas desaparecem, as que diziam DESVIO, claro, as outras placas, as das localidades lá estão: Pouca Farinha, Rabo do Lobo, Burdo, Teimosas, etc., mas para quem não conhece é a mesma coisa que nada.

- “Olha lá, pá, então não tás a ver que Aljezur é a seguir a Pouca Farinha!”

Diz o povo que: “Para quem sabe ler, um pingo é letra…! Ou que “Para bom entendedor, meia palavra basta.”
E com isto fazem-nos passar por estúpidos!

Ainda se fosse em Lisboa ou em Viseu, onde há sempre uma rotunda à qual se podem dar 2 ou 3 voltas enquanto se raciocina sobre qual será a melhor saída, ou no Porto, onde todas as ruas vão dar ao Douro. No meio do campo, as coisas não funcionam assim, as referências são mais complicadas, algumas até andam. Por exemplo, as vacas, da primeira vez que passamos estão numa posição, da segunda vez já estão noutra posição. Não tem culpa, as vacas, nem as ovelhas, nem o restante gado.

Diz o meu filho que assim até se conhecem sítios novos.
Esperto o rapaz.

Mas os nervos dos adultos ficam em franja e até descobrimos o rumo não descansamos.
Afinal estão à nossa espera, pelo menos o jantar…

Ligámos o GPS. Não queríamos, por pura teimosia. Afinal fomos lá o ano passado.!
Viva o GPS!

Já agora aconselho, praia de Odeceixe e restante costa do parque Natural da Costa Vicentina.

09/06/11

O presidente da Junta (parte II)

continuação de "O presidente da Junta"

17 h, a Dona Florinda está a terminar de lavar o chão da junta quando chega o senhor Presidente.

- Boa tarde, Florinda, como está a senhora? E o seu marido, está melhor?
- Como ontem, senhor Presidente, como ontem…. – responde ela com o olhar a perder-se num momento em que era nova e o Horácio a pediu em casamento. Por um momento sentiu-se livre. O pobre homem vivia agora confinado à casa e a mulher confinada a ele.
- Como correu o dia?
- Ligou para aí uma senhora, por causa de umas ruas, ficou de ligar outra vez.

Mal ela acabava de falar, tocou o telefone. Trim!Trim! Som irritante na sala vazia.

- Está, bom dia! Quero falar com o Sr. Presidente.
- Sim, sou eu. Faça o favor de dizer, minha senhora.
- Os munícipes querem fazer o cartão do cidadão e o senhor não dá nome às ruas!
- Peço desculpa, minha senhora, mas na nossa freguesia não tenho conhecimento de ruas sem nome.
- Não há ruas sem nome?! Há isso é que há. O que me diz da Cova dos Alqueides? Isto não é morada, sabe o que isto deve ser, é só uma casa e dão-lhe este nome. E não é assim! O senhor foi eleito para resolver os problemas dos seus munícipes, e eles tem de ter moradas de jeito. Ou o senhor resolve isto ou os seus munícipes não vão ter cartão do cidadão que por mim não passam. E o senhor é o responsável. E tenho aqui outro munícipe que diz que mora na Barraca do Costa, na sua freguesia, mas digo-lhe já que está errado, esse topónimo não é da sua freguesia, mas na Senhora da Cela, que é o que é oficial. Diga lá, onde começa e onde acaba?

Eudócio abre os olhos de espanto. Em 15 anos à frente da Junta da sua terra, já tinha aturado algumas bebedeiras a gentes da terra, principalmente do Puga, alguns desacatos aos rapazes e às beatas por causa do local da festa, mas nunca se lhe tinha deparado com um caso destes.
"Esta gente de Lisboa não deve ser boa da cabeça!" - conclui satisfeito com a própria conclusão.

- Minha Senhora, só lhe posso dizer que Cova dos Alqueides é o nome correcto e o Barraca do Costa é aqui no centro da vila, a Senhora da Cela é na outra ponta do concelho, nem confronta com os limites da nossa freguesia. - responde o presidente apardalado com tanta pergunta e tanto disparate junto. Pensa para si ao mesmo tempo que ergue os olhos para o céu, como que a pedir resposta à sua pergunta. – Mas de onde é que isto me caiu?!

Do outro lado, a voz continua, insistentemente, sem parar, cada vez mais alto.

- Está enganado, o oficial é que conta, e assim não vai haver cartão do cidadão para ninguém e a responsabilidade é sua. O senhor não sabe que há leis? As casas tem de estar numa rua com nome a começar por Rua, Avenida, Praceta, etc. Vamos fazer assim, envio-lhe uma lista e o senhor envia-me um mapa com os nomes correctos, está bem? Já lhe estou a enviar. – e sem esperar resposta, que não há tempo para tanta incompetência, envia o email.

Com um sorriso trocista, pensamentos pecaminosos a bailarem-lhe na ponta da língua, contem-se.
- Certo, certo, minha senhora. Envie se faz favor que amanhã devolvo-lhe isso. – responde mostrado uma calma que nem ele sabe onde foi buscar.
Passados 2 dias, o telefone toca, Eudócio vê que é um número de Lisboa, cauteloso chama a Dona Florinda.
- Florinda, atenda por favor e se for de Lisboa, diga que não estou.


- "Mas que será que se passa com o presidente desta Junta, faz seis meses que o tento contactar e nunca está." - pensa para si - "Por isso é que os problemas não se resolvem..." e ri-se sozinha.

08/06/11

De que serve ter o mapa...

"De que serve ter o mapa
Se o fim está traçado,
De que serve a terra à vista
Se o barco está parado

A terra pertence ao dono e a paisagem a quem sabe olhá-la"




Miguel Sousa Tavares

07/06/11

Tratado de Tordesilhas

Nem a propósito, então não é que hoje faz anos o Tratado de Tordesilhas!

Precisamente 517 anos.

Para quem não sabe o que é o Tratado de Tordesilhas remeto para a wikipedia:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Tordesilhas

Turismo e toponímia

O turismo está intimamente ligado à toponímia. Arriscaria mesmo dizer que são unha com carne.

 - Quem é que viaja sem um mapa?

Quem gosta de andar perdido, quem navega sem rumo, quem se esqueceu do mapa e de mais meia dúzia de coisas essenciais, quem não sabe ler um mapa, nem de cabeça para baixo, nem de cabeça para cima. Os  tótós é que não!!!
Seja um simples mapa de Portugal em papel, um moderno GPS, roteiros das localidades, mapas impressos a partir do Google Maps/ Sapo mapas/ Bing Maps (valha-me Deus esta publicidade!) ou até mesmo um rascunho desenhado com o caminho até ao sítio...

- E associados aos mapas, o que é que se encontra?

Nomes disto, nomes daquilo, praias, rios, cabos, barragens, ruas, toponímia seus tótós!

E como se aproxima um fantástico fim de semana de 4 dias (graças a Camões, a Portugal e ao Santo António de Lisboa), porque não um passeio turístico por este nosso belíssimo país?

A sugestão de hoje vai para o seguinte sítio:



02/06/11

O Manual !!!

Caro Berto, fiquei muito satisfeita com a sua pretensão de criar um ou O verdadeiro Manual de Toponímia.
É inadmissível que, no séc. XXI, Portugal não tenha um Manual de Toponímia único e oficial, que regule a toponímia a nível nacional e, que este pequeno rectângulo de 89 mil Km2 seja gerido pela carolice e boa vontade de alguns peões do pequeno poder político. Ou seja, está a toponímia sem rei nem roque...

Berto, deixou-nos com água na boca à espera dos próximos desenvolvimentos.
A sua amiga tótó.